Dona Yvonne do Amaral Pereira
(1900-1984), reconhecida médium do Movimento Espírita, em estado sonambúlico
recordava-se de suas existências anteriores, o que lhe valeram alguns livros
escritos por ela a respeito.
Em um de seus livros
“recordações da mediunidade” ela relata que a capacidade de recordar-se de
vidas passadas é um fenômeno bastante raro, embora se possa perceber estranhas
reminiscências sem saber tratar-se de um passado espiritual. Sofre-se em
silêncio quando não se tem ninguém a quem confidenciar essas sensações, por
falta de crédito e por medo de ser discriminado.
No entanto, embora seja o
desejo de muitas pessoas, não é recomendável se procure por esse tipo de informação,
pois, se a lei da Criação achou por bem colocar um véu sobre o passado é porque
nenhuma vantagem traria para o progresso do Espírito, agora em outro corpo, e
com uma nova história, um novo recomeço.
Allan Kardec na questão 392 de
O Livro dos Espíritos questionou os Espíritos sobre essa questão: por que o
Espírito encarnado perde a lembrança do seu passado? E os Espíritos
responderam: o homem nem pode nem deve saber tudo; Deus assim o quer, na sua
sabedoria. Sem o véu que lhe encobre certas coisas o homem ficaria ofuscado,
como aquele que passe sem transição da obscuridade para a luz. Pelo
esquecimento do passado ele é mais ele mesmo.
Kardec complementa dizendo: “Se
não temos, durante a vida corpórea, uma lembrança precisa daquilo que fomos, e
do que fizemos de bem ou de mal em nossas existências anteriores, temos,
entretanto, a sua intuição. E as nossas tendências instintivas são uma
reminiscência do nosso passado, às quais a nossa consciência, - que representa
o desejo por nós concebido de não mais cometer as mesmas faltas, adverte que
devemos resistir”.
Yvonne relata também no livro supracitado
que o Espírito de Bezerra de Menezes disse a ela que alguns casos de
transtornos mentais, internados em hospitais psiquiátricos, nada mais são do
que estados agudos de excitação da subconsciência recordando existências
passadas tumultuosas, ou até criminosas, acarretando na atualidade remorso, auto
obsessão e a obsessão propriamente dita.
Narra a autora, ainda, que o fato
de se recordar de vidas passadas pode produzir choques morais, muitas
vezes intensos na personalidade, acarretando anormalidades. Esse fenômeno
constitui uma provação para o Espírito, ainda pouco evoluído.
Yvonne alerta também para o
fato de que a subconsciência expulsa, momentaneamente, ao calor de uma emoção
forte, as ondas das lembranças calcadas nos seus refolhos, há choque emocional
e sofrimento indefinível.
Ela atribui à Doutrina
Espírita o fato de não sucumbir na sua presente existência, porque nasceu com
essa faculdade de se recordar de vidas passadas, como forma de provação,
pensando-se louca e tendendo ao suicídio mais uma vez.
Outra observação importante
trazida pela autora diz respeito a revelações transmitidas por alguns médiuns, que,
geralmente, com raríssimas exceções, são sempre duvidosas, fantasiosas, não
tanto pelos médiuns, mas por Espíritos mistificadores querendo se divertir às
custas dos Espíritas curiosos e invigilantes, ou, em outros momentos o próprio
médium pode deixar-se levar pela sua imaginação e dizer o que a sua própria
mente criou, num fenômeno totalmente anímico.
A médium, autora do memorável
livro “Memórias de um suicida”, explica que a revelação se dá dentro do próprio
ser, com suas tendências, suas visões repentinas em vigília ou durante o sono.
Revelação que desperta sentimentos de angústia, saudade e até desespero ou uma
emoção balsamizante de esperança no futuro e alegria do espírito.
Yvonne do Amaral Pereira em
consequência de erros do passado, trouxe, como medida expiatória, uma lembrança
lúcida de outras encarnações desde criança. Isso lhe acarretou muitos
sofrimentos e desespero. Quando tinha três anos de idade, não conseguia aceitar
sua nova condição simples, não reconhecia seus pais dessa existência, e, como
uma criança birrenta não queria deles se aproximar com o carinho que se espera
de um filho.
Lembrava-se dos pais de
outrora e de sua rica casa, pedindo que a levassem até lá e que trouxessem seu
pai, que não era aquele à sua frente. A autora conta que dos três aos nove anos
de idade, sentia uma saudade imensa desse pai de outra vida.
Uma saudade elevada a grau super-humano,
me levavam quase à loucura. Passava dias e noites em choro e excitações, que
perturbavam toda a família, e o motivo era sempre o mesmo: o desejo de
regressar à ‘casa de meu pai’, de onde me sentia banida, a saudade angustiosa
que sentia dele e de tudo o mais de que me reconhecia separada. Jamais senti
prazer num divertimento infantil, fui uma criança esquiva, sombria e sem riso,
atormentada. (PEREIRA, 2009, p. 53).
Somente com a frequência a um
centro espírita, recebendo a fluidoterapia (passes e água fluidificada) e
participando de evangelização é que a médium conseguiu uma trégua para
conseguir continuar nessa sua última existência.
Com a mediunidade de vidência,
dentre outras, Yvonne enxergava seu amigo espiritual Roberto que lhe dizia que
era preciso se lembrar de alguns episódios de outras vidas, no sentido de
fazê-la refletir para a emenda definitiva. Os sofrimentos seriam inevitáveis,
mas ele estaria ao lado dela para auxiliá-la a suportá-los com firmeza e ânimo.
Quando soube através de
Bittencourt Sampaio que haveria de passar por muitos reveses nessa vida, tratou
de estudar a Doutrina Espírita. Assim, mais importante do que saber de vidas
passadas, é conhecer, nessa existência, o Espiritismo, aprender com essa
Doutrina esclarecedora sobre o que é a reencarnação, seus propósitos, o papel
que compete a cada um desempenhar, alicerçados pelo Evangelho de Jesus, conhecendo
o próprio Jesus nessa vida.
Essa deve ser a meta almejada,
olhar para frente, projetando o futuro a partir da semeadura de hoje.
Yvonne teve muitas
dificuldades nessa existência por causa de seu passado culposo, suicida, mas
com certeza semeou uma nova existência plena, devido à sua resignação,
aceitação e devotamento à causa do bem.
Que fique a lição dessa médium
extraordinária e silenciosa, mas produtiva e amorosa. Viver o hoje com vista no
amanhã, Kardec de um lado e Jesus à frente.
REFERÊNCIA:
PEREIRA, Yvonne A. Recordações
da Mediunidade 4. Ed. Rio de Janeiro: FEB, 2009.